segunda-feira, 2 de maio de 2016

Pequeno tratado sobre a Transa Sincera


Vontade de transar e vontade de gozar são duas vontades diferentes, mas que podem ser simultâneas.

A vontade de transar está para além da vontade de gozar, mas não a exclui.

Gozar é verbo intransitivo. É possível gozar sozinho, atingindo ou não o clímax. O gozo depende essencialmente da mão, da memória e da imaginação.

Transar é verbo transitivo. É impossível transar sozinho. A transa é um acordo entre duas partes, uma entrega mútua, uma troca, uma dança a dois, um jogo amistoso.

Para gozar existe apenas uma vontade de ter prazer, enquanto que para transar existe tanto a vontade de ter prazer quanto a vontade de dar prazer.

Na raiz da vontade de gozar existe a atração física, que surge apenas dos instintos. Corresponde às sensações do baixo-ventre.

Na raiz da vontade de transar existe a atração física, algum grau de amizade e uma vontade de agradar, que surgem tanto dos instintos quanto das emoções e dos sentimentos. Corresponde às sensações do corpo todo.

Gozar do corpo de outrem visando apenas à própria satisfação não é transar, é usar.

É comum duas pessoas usarem uma à outra chamando isso de transa — e ambas sentirem-se satisfeitas.

Impulsos sexuais sem vontade de agradar são só uma vontade de gozar. Vontade de agradar sem impulsos sexuais é só simpatia. Vontade de agradar e impulsos sexuais simultâneos são vontade de transar.

A vontade de agradar da transa pode ter duas raízes: a caridade sincera e a caridade falsa.

A caridade sincera é incondicional. É uma satisfação em doar-se e sentir no corpo do outro uma extensão e um reflexo do seu próprio prazer.

A caridade falsa é condicional. É uma necessidade de confirmação da própria capacidade de dar prazer a fim de servir de alimento à vaidade e moeda de troca para outros favores sexuais.

Logo, as transas podem ser categorizadas em sinceras e falsas em função da raiz da vontade de agradar.

Não é possível saber se uma transa é sincera ou falsa apenas observando sua manifestação externa. Portanto, a transa sincera diz respeito apenas à boa-vontade do sujeito transante na hora da transa.

Por vezes nenhum dos transantes é sincero, por vezes só um é sincero, por vezes ambos (dois ou mais) são sinceros.

Nestes termos, aquele que se envolve com alguém baseado exclusivamente na sua própria vontade de gozar costuma acreditar que qualquer tipo de envolvimento sexual é uma transa sincera.

Uma transa sincera é mais comum em uniões baseadas em amor e respeito. Porém, é independentemente de compromissos de longo prazo ou contratos de exclusividade conjugal.

A atenção a esses princípios leva a constatar, com certo assombro, que talvez pouca ou nenhuma vez na vida tenhamos transado sinceramente.