terça-feira, 22 de setembro de 2009

Um garotinho atrapalhado

E o garotinho perdido andava na rua, sozinho, com um vidro de mel na mão esquerda e uma revista na direita. Suas costas razoavelmente corcundas evidenciavam sua baixa auto-estima. Andava de um ponto a outro, mas não em linha reta. Sabia que estava voltando pra casa, sabia o caminho, conhecia todo mundo em volta, mas estava perdido.

Chegou em frente à sua casa, olhou pra ela, tocou a campainha e, nesse exato momento, foi assaltado por uma dúvida que realmente o assustou: era mesmo essa sua casa? Sim, era, mas estava realmente digna de desconfiança.

O garotinho teve um leve ataque de Síndrome de Truman. Essa é uma doença que me preocupa pela velocidade com que se impregna na sociedade. Hoje em dia é tudo culpa da mídia, culpa da mídia... Não ocorre pensar que são só publicitários fazendo campanhas com base em conceitos-chave e metáforas? Uma propaganda de Rollex não é racista só por que tem um coroa branco de olhos claros jogando tênis, nem uma propaganda de cerveja é satânica só por incentivar subliminarmente o sexo, a vadiajem, a farra. Publicidade é isso, 171 puro. Mas o garotinho não pensa em ser publicitário.

Ele sabe qual profissão vai seguir: qualquer uma em que não precise ajudar ninguém. Médicos salvam vidas, professores ensinam pessoas, advogados ajudam pessoas, eletricistas ajudam pessoas, mecânicos ajudam pessoas, bombeiros ajudam pessoas... são favores em troca de dinheiro. O garoto perdido não quer entrar nessa engrenagem capitalista (não desse jeito). Em que profissões ele pode se encaixar? Fórmula 1?

O garotinho se deixa levar pelos seus eus, suas máscaras, sua imagem. O maior erro da sua adolescência foi basear-se no que os outros acham dele para criar sua própria identidade. Resultou num grande vácuo, uma alma presa num ego vaidoso. Tudo isso por que faltou referência. Ah se ele soubesse como o mundo é grande... se ao menos imaginasse que existem seis bilhões iguais a ele nesse mundo, cada um com seu mundinho, suas certezas, referências. Será que ele já parou pra pensar que "eu" é só um ponto de vista diante do mundo? Cada um só tem um "eu", por isso dão tanta importância assim. Talvez todos devessem desenvolver um pouco mais o desprendimento, se desapegarem do "eueueueueueueueueueu" e olharem para si mesmos do ponto de vista do universo: um grãozinho de poeira, um nada no meio do todo. E a partir daí, pensarem "pra que isso serve? No que essa pessoa pode ser útil pro resto?". Quem pensa assim não se envaidece com um parabéns nem se desarma com um elogio. Mentira, elogios sempre desarmam. Almas desapegadas do ego são mais produtivas e ativas, pois não se prendem a vontades fúteis, mimos, preguiça, raiva, inveja, ciúmes, lascívia, soberba, enfim - tudo o que o padre fala que é errado sentir. Tudo isso gira em torno do egoísmo! E egoísmo, como o próprio nome diz, é o culto ao si mesmo, é se considerar mais que alguém só por você ser você e o outro não. "Dispa-se do ego e seja feliz", alguém importante disse isso.

Um dia esse garotinho vai entender tudo. Vai sentar numa cadeira, sentir a cadeira, olhar em volta, ver as coisas, cada coisinha, saber que são átomos amontoados e se fascinar com a ideia de que são átomos amontoados. ÁTOMOS! Sabe o que é um átomo? O que tem dentro dele? Um dia nosso amigo vai olhar pro céu e saber que o infinito sempre se apresentou pra ele na forma de um plano escuro com pontinhos cintilantes. Ele vai sentir um vazio perturbador quando se deparar com esse infinito, e daí vai brotar uma humildade sincera que mudará seu conceito sobre vida, sua postura diante do mundo e todos os seus sonhos a longuíssimo prazo.

Mas enquanto esse dia não chega, ele segue, perdidinho, seguindo scripts, regras, imposições, formalidades, opiniões e preenchendo o vazio com alegrias fugazes. Vou chamar o garoto de Joãozinho... nada mais justo, não é? Joãozinho chegou em casa, comeu aqueeeele pão com mel e margarina e depois se deliciou com uma coca totalmente sem gás que o fez arrotar misteriosamente. Ele não sabe o que pensar sobre isso.

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